terça-feira, 23 de agosto de 2011

O meu último pedido

Terça, 23 de Agosto
Querido W,

Lhe escrevo pra dizer que não quero lhe pedir nada. Eu não quero e nem posso exigir nada de você. Não quero poemas, nem versos de amor, nem canções dedicadas pra mim. Não quero que você sinta ciúmes, nem que me ligue pra dizer que sente saudades. Não quero que você me coloque em primeiro plano na sua vida, aliás, não quero que você me coloque em plano nenhum. Não quero rosas, nem cartões, nem chocolates e muito menos ursos de pelúcia. Nem pense em me mandar mensagens de texto e nem me marque nas suas fotos nas redes sociais. Não quero que você me convide pra sair, nem que abra a porta do carro, nem que me acompanhe até a minha casa, nem que me peça pra ficar. Não quero que você fique com outras pessoas pra me fazer ciúme, nem saia com seus amigos pra dizer que está bem, nem que poste frases felizes no facebook. Não quero que você diga que me ama, e nem quero que você me peça pra voltar. Não quero nada seu. Não posso ter mais nada seu. E nem quero que você se preocupe com isso. Eu só quero, no íntimo que você pense em mim. Que não diga a ninguém, que não peça a opinião de ninguém, que não alimente nenhuma expectativa, só pense. Que você imagine o que eu estou fazendo agora e que passe algum tempo fazendo suposições sobre com quem eu tenho saído. Eu só quero que você imagine como poderia ter sido e que ria sozinho quando pensar. Eu não quero saber de nada disso, mas eu desejo profundamente que isso aconteça. Eu quero que você saiba que eu não vou atrás de você, e também não quero que você me procure. Quero que se sinta livre, assim como eu estarei. E de longe, por telepatia, quem sabe, eu vou saber que você fez exatamente aquilo que eu gostaria que fizesse: Pensou.
Lembranças minhas, 
P.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O som de porta batendo

Quarta-feira, 17 de Agosto

Querido Leitor,


Ela bateu a porta violentamente e de propósito. Ela sabia o quanto batidas de porta o irritavam. Dessa vez ela bateu a porta e deixou dentro de casa tudo aquilo que ela nunca aprovou, e sempre foi obrigada a engolir silenciosamente. Agora tudo acabara, aquela tinha sido a batida definitiva que separou o mundo dela daquele precipício todo. E ao enterrar definitivamente seu velho destino ela lembrou das noites vazias no seu antigo quarto, do cigarro fumado na janela e do “BOM AR” que ficava escondido no guarda-roupa e que era usado pra disfarçar o mau cheiro cinzento. Lembrou das vezes que ficou de porre sozinha e das garrafas de run vazias que ela começou a colecionar pra se lembrar depois. Todas elas eram riscadas com a data e ficavam numa cômoda trancada à chave e que quando perguntavam servia pra guardar coisas velhas. Ela tinha ficado boa em esconder tudo. Apagar os rastros, disfarçar os cheiros, jogar nos lixos certos as provas do crime passional que ela cometera. Deixar de ser ela pra ser alguém que ela nunca quis ser. Depois de tanto tempo fingindo ser aquilo que nunca tinha sido, parecia fácil se acostumar, mas isso não seria ela. Aquela mulher altiva, vinte e poucos anos, signo de fogo, e cheia de ideias perversas. Ela bateu a porta e fechou de vez as possibilidades de voltar a ser aquele espectro que fazia tudo certo, pros outros, e que estava se matando aos poucos. Agora ia pra qualquer lugar, onde o endereço não fosse de alguém importante, onde as paredes fossem de qualquer cor, menos branca e sem vida, onde o perfume que exalasse da sua casa não fosse de "BOM AR", mas de cereja, pimenta ou simplesmente o cheiro da fumaça do seu cigarro. Algo dela e que só ela desse ordens, que só ela escolhesse o que fazer pro jantar, ou que ela pudesse convidar as figuras mais exóticas que conhecesse durante o dia, pra trocar uma ideia tomando uma dose de run. Aquela mulher era linda, mas ficava mais linda quando era quem ela queria ser, sem se limitar a quatro paredes pintadas de branco e um quadro de uma senhora idosa pregado na sala.  Depois da derradeira batida, ela enfim, tomara as rédeas da sua vida.

Com meia afeição,
P.