domingo, 25 de dezembro de 2011

Só por ser Natal

Domingo, 25 de Dezembro, Natal

Meu bem, 




Eu não acredito em papai noel, mas eu pedi você pra ele, de presente. Eu pedi um querer igualzinho ao seu, sóbrio, leal, cheio de carinho pra me dar. Eu pedi até seus defeitos, pra que eu possa domar. Pedi que o ano novo fosse a porta de saída do ‘eu sozinha’, pra porta de entrada do ‘nós dois’. Hoje, eu me senti no direito de desejar você, de uma forma mais séria.  Porque é natal, porque nessas datas as pessoas acreditam em coisas ingênuas, em fraternidade, em dias melhores. Eu pedi a paz de óculos, o prazer de roupas novas, a alegria de sol e praia nos pés, o amor filantrópico, a amizade verdadeira. Hoje, só por ser Dezembro, e por eu ter a impressão de que algo maior está por vir, eu me dei autorização de querer algo melhor. De ousar planejar. De sonhar, talvez. Hoje, por ter tanta comida na mesa, eu quis  fartura pro ano que vem. Eu quis a sensação dos satisfeitos, e quis algo que aliviasse a minha recente desilusão com as pessoas. Eu até me esforcei pra crer de novo que os bons são maioria, como no comercial da coca-cola. Eu quis acreditar de novo, quis ser feliz, quis fazer parte do mundo de novo, e nessa minha vontade toda, quis você na minha vida. Quis a fé dos justos, a mansidão dos santos, e paredes pintadas de outra cor. Quis sereno, quis sem fim, logo eu que sempre tive medo de permanências. Só por ser natal, eu desejei ser feliz, como eu me lembro ter sido um dia. Não da mesma forma. Mas feliz. Só por ser noite, por ter lua, por ser tarde, por ser natal.   Eu quis você comigo nessa, de mãos dadas. Não que eu não te queira todo dia, mas hoje, algo me fez te querer mais. Hoje eu te desejo mais porque eu me sinto uma pessoa melhor no natal, porque eu me sinto realmente feliz e você é a pessoa ideal pra eu dividir essa felicidade toda. Você é o presente perfeito. 


Feliz Natal, 
P.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Esse teu cigarro.

Quarta-feira, 14 de Dezembro

Querido, 




Você é uma das poucas pessoas que eu conheço que conseguem unir o politicamente correto com o proibido. Quem te vê com essa pose sóbria, cabelo penteado, óculos de grau e frases bem articuladas, não imagina o quão delinqüente você pode ser. Eu mesma, quase me deixo enganar quando você me impressiona com sua inteligência perspicaz, suas referências bibliográficas notáveis, seu gosto por MPB, com sua maturidade de homem de mais de vinte anos.  E agora, te vendo assim, meio Casanova, meio Don Juan de Marco, fumando esse Hollywood preto, e virando doses de tequilas na tora, não consigo te associar ao cara pacato que eu conheci. Não acho que o cara certinho é melhor que esse. Na verdade, esse teu lado meio vadio me atrai bem mais. Mas o que mais me instiga é o poder que você tem de coexistir dos dois jeitos. Ser o incorrompível no trabalho, não cometer erros ortográficos na internet, estar por dentro das notícias atuais, e ao mesmo tempo, pegar pesado na academia, se embriagar, e fumar. E dentre os seus venenos minimalistas, o que eu ainda não consegui digerir muito bem foi o cigarro. Quer dizer, como um cara tão esperto coloca pra dentro mais de mil toxinas, sabendo o mal que tudo isso faz? O teu cigarro estraga a dualidade rara que você construiu. Mas quer saber?! Eu acho extremamente atraente te ver fumando. Em todas as outras pessoas parece sujo, menos em você. Você fica olhando pro nada e realizando o ritual maldito de sugar e expelir fumaça, como se injetasse pensamentos perversos e colocasse pra fora os bonzinhos. Me faz pensar em misturas de ácidos, comidas afrodisíacas, drogas, rock and roll, sexo selvagem. Eu viajo na pose que você fuma. Parece o cara mais imbatível do ambiente, o mais poderoso, o mais viril. E pra mim, você é. Sinto a mistura do seu perfume com fumaça, o gosto de Halls da preta com toxinas à self-service, o cara certinho com o devasso que eu mereço, e ninguém consegue imitar isso.  Definitivamente, eu passei a admirar o cigarro depois de você. E admitir que cigarros não foram criados para acabar com os pulmões das pessoas, mas para dar o devido poder à quem é de direito. Eu odeio cigarro, mas adoro ver você fumar.

Com afeto,
P.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Mentiras sinceras me interessam

Sábado, 10 de Dezembro

Meu bem, 





Eu presenciei você mentindo que era só meu. Eu estava lá quando você encheu a boca pra dizer, na frente dos seus amigos, que ninguém mais te importava, que eu era tudo pra você naquele momento. Acontece que eu não percebi  o “naquele momento”. Como aqueles contratos que você assina sem reparar nas letrinhas miúdas. A verdade é que você é tão perfeito, faz tudo tão certo, diz exatamente as coisas que vão me fazer gostar ainda mais de você, que eu quase me deixo levar por seus encantos violentos. Mas acontece que eu tenho uma voz quase inescutável que sussurra que mesmo você fazendo tudo certo,  é o cara errado pra mim. Errado por ser tão carinhoso, tão atencioso, tão meu. E me fazer acreditar que eu posso realmente ser feliz. Com essa felicidade meio fora do normal, cheia de proibições e instabilidades, cheia de condições que eu deixei você impor. Você é cruel. Por me levar ao céu, e deixar eu reconhecer sozinha que aquilo não me pertence. Por me ser completamente sincero e me fazer sentir totalmente responsável por isso que a gente diz que tem. Quando eu tô na sua frente, eu sinto como se estivesse exatamente no lugar que eu deveria estar. Mas ai, quando eu deito a cabeça no travesseiro à noite eu percebo que estar com você não é tão necessário quanto eu imaginava e me dou por satisfeita por ser só, por ter você e ao mesmo tempo não ter. Não ter você só me pesa nas tardes frias de domingo, quando meu corpo sente uma falta cruel de algo que seja meu, que eu domine de verdade. Não te ter no meu domínio só me vem quando eu vejo outros casais, e me vem aquele vazio sem graça como ir no supermercado e esquecer o que ia comprar. Você me faz falta quando eu invejo a estabilidade que eu não posso ter. Não ter você só me pesa quando eu percebo que no fim das contas, eu estou só, sem você e sem ninguém que me faça sentir o que você me faz. 

Com algo mais meu que seu,
P.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Mixto Quente.

Recife, 03 de Dezembro

Querido M, 


Vai faltar chão pra nós dois. Vai faltar ar respirável, que não seja fumaça de cigarro ou ar condicionado. Vai faltar espaço, vamos empurrar os móveis, tirar a cama do lugar, quebrar alguns Suvinís que tiverem na estante. Vai faltar música que defina a intensidade disso tudo, e não vai ter verso certo pra contar essas nossas travessuras. Vai faltar expectador, luz, gravidade, quando a gente se encontrar. Vai faltar tempo pra pôr em prática todas as nossas idéias perversas, e quanto mais tempo a gente tiver, mais idéias vão surgir, mais tempo vai faltar. Vamos fazer um mixto quente de pele, suor, colchão, você e eu. Porque vai faltar nexo, mesa, roupa. Vai faltar previsão no horóscopo sobre o nosso amor. A lua estará minguante, e nem será tempo de Vênus. Vai faltar explicação, equação matemática, prova científica. A gente vai contrariar a física, que se danem as leis de Newton, os nossos corpos vão coexistir. Vai faltar água pra apagar o fogo dobrado dos nossos signos. E vai faltar quem não morra de inveja da gente. A gente vai beber água no copo da Mc'Donalds, e nem vai se importar se não tiver nada comível na geladeira. A gente vai viver um do outro. Vai faltar teto pro tanto de prazer que a gente vai ter junto. Os vizinhos vão ficar ouvindo as nossas risadas e tentando imitar a nossa felicidade. Vai faltar sono, televisão, telefone tocando. Quando a gente tiver junto, o mundo lá fora vai se dissolver num plácido desejo de que a gente continue, apenas. A gente vai se sentir completo, satisfeito, como quem mata a fome. Vai sobrar sentimento, cheiro de perfume, temperatura alta, você e eu. 

Saudades,
P.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Bilhete jogado por baixo da porta do quarto



Se for pra colher algo meu, entenda,
só tenho folhas secas e umas rosas murchas pra te dar.
Uns girassóis cabisbaixos que foram do verão passado,
ou quem sabe umas tulipas azuis que nunca ganhei de ninguém.
Se for colher algo de mim, agora só tenho ramos pra oferecer.
Não tenho espinhos, não. Ao menos isso.
Não tenho a intenção de ferir ninguém.
Só estou murcha demais pra ser colhida.
Tem outras flores, outros jardins, mais atraentes que o meu. Agora, aqui é outono.


Bilhetinho de porta de geladeira

Não esqueça de levar o cachorro pra passear
De pôr o lixo pra fora, checar a correspondência
Arrumar suas malas e ir embora.
Não esqueça de me esquecer.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Quero você. Mas quero muito.

Quinta, 27 de Outubro de 2011


Meu bem querer,


Eu quero escrever pra você e não apenas sobre você. Eu quero poder ficar do seu lado o máximo de tempo possível, e no tempo que não fosse possível, estar no seu pensamento. Eu quero ter você de todo jeito. Com roupa social, à estilo despojado-chique, ou com aquela bermuda folgada que você usa pra ficar em casa. Eu quero te ligar quando eu tenho vontade, mandar sms sempre que eu me lembrar de você, ou encher sua página de rede social com declarações de amor minhas. Eu quero poder te chamar de meu amor, ou te beijar na frente de todo mundo, quero que meus olhos falem o tanto de emoção que eu sinto quando eu tô perto de você. Ah... eu quero ter você não só pelo fato de ter, mas de ter e viver, e sentir, e pulsar, tudo ao mesmo tempo. Eu quero não ter que jogar esse jogo idiota de ter que te deixar solto pra você vir pra mim, de fingir não me importar pra você querer ficar comigo, de te ignorar pra você me dar valor. Sempre odiei esses jogos, são frios, sádicos e superficiais. Eu quero ficar no seu pensamento, até você não suportar ficar longe de mim, porque é como eu estou agora. Quero mandar o seu coração sentir a mesma coisa que o meu sente toda vez que estamos juntos. Quero ter seu amor inesgotável e sua paixão ardente, pra que você não consiga desejar mais ninguém além de mim. Porque eu sou egoísta, eu quero você por completo, o tempo inteiro. Quero você completamente apaixonado por mim, pra eu não ter que jogar pra te ganhar. Eu não quero ganhar você, eu quero tomar você pra mim. Quero te rasgar, te morder, te domar e te chamar de meu. Quero você sem rodeios, sem frescuras, sem contratempos. Quero você, seu cabelo, seu corpo, seus sentidos, seus sentimentos. Todo meu. Quero e não me canso de querer. Porque você me faz te querer o tempo todo, e a culpa dessa minha insanidade é toda sua. Você que me conquistou com esses olhares, esse jeito, essa coisa de magnética que te trouxe pro meu subconciente. Agora aguenta, e me deixa te querer do jeito certo, do jeito errado, ou de qualquer jeito que venha na cabeça na hora. Me deixa te querer do jeito que ninguém conseguiu. Eu quero você, mas eu quero muito.

Lembranças minhas,
P.

sábado, 3 de setembro de 2011

Moça bonita banhada de cor.

  Sábado, 03 de Setembro
Querido leitor,


Cabelos cacheados soltos e bem perfumados. O brinco de pena de pavão se enrosca nos seus cachos e dá a impressão que o seu cabelo tem uns efeitos pitorescos. Uma blusa canoa folgada e leve como o vento que bate no rosto dela e destaca o frescor da juventude. O vento do Alto da Sé parece mais forte do que em outros lugares, no sol poente. E parece que a intenção dele é levá-la pra enfeitar o céu, com todas as suas cores, e seu perfume amadeirado que inebria o ambiente. Ela fala de solidão como se fosse doce, fala de acaso como se fosse uma amora graúda, e ai vai dando vontade de comer todas as palavras dela. Ela vai andando, e eu olho pros seus pés.  Reparo no pingente de cereja da sua tornozeleira. E antes que eu pudesse falar dele, ela subiu num degrau e abriu os braços devagar como se quisesse colher o restinho do sol, que aliás deixava a pele dela numa tonalidade muito bonita, meio morena. Ela passava uma paz, ali em pé com os braços abertos, que eu senti vontade de fazer o mesmo, e me deixar levar por essa deusa dos sentidos, que usava anéis de coco ao invés de jóias. Ela perguntou se eu tava sentindo o cheio de terra molhada, e ao forçar a inspiração só senti ainda mais o cheiro do perfume dela. E ai, eu senti estar no lugar certo, seguro, alto, e próprio para ser feliz. Eu senti a felicidade palpável ali, junto da beleza embriagante daquela moça banhada de cores, perfumes e sabores de fruta.
Com Afeto,
P.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

O meu último pedido

Terça, 23 de Agosto
Querido W,

Lhe escrevo pra dizer que não quero lhe pedir nada. Eu não quero e nem posso exigir nada de você. Não quero poemas, nem versos de amor, nem canções dedicadas pra mim. Não quero que você sinta ciúmes, nem que me ligue pra dizer que sente saudades. Não quero que você me coloque em primeiro plano na sua vida, aliás, não quero que você me coloque em plano nenhum. Não quero rosas, nem cartões, nem chocolates e muito menos ursos de pelúcia. Nem pense em me mandar mensagens de texto e nem me marque nas suas fotos nas redes sociais. Não quero que você me convide pra sair, nem que abra a porta do carro, nem que me acompanhe até a minha casa, nem que me peça pra ficar. Não quero que você fique com outras pessoas pra me fazer ciúme, nem saia com seus amigos pra dizer que está bem, nem que poste frases felizes no facebook. Não quero que você diga que me ama, e nem quero que você me peça pra voltar. Não quero nada seu. Não posso ter mais nada seu. E nem quero que você se preocupe com isso. Eu só quero, no íntimo que você pense em mim. Que não diga a ninguém, que não peça a opinião de ninguém, que não alimente nenhuma expectativa, só pense. Que você imagine o que eu estou fazendo agora e que passe algum tempo fazendo suposições sobre com quem eu tenho saído. Eu só quero que você imagine como poderia ter sido e que ria sozinho quando pensar. Eu não quero saber de nada disso, mas eu desejo profundamente que isso aconteça. Eu quero que você saiba que eu não vou atrás de você, e também não quero que você me procure. Quero que se sinta livre, assim como eu estarei. E de longe, por telepatia, quem sabe, eu vou saber que você fez exatamente aquilo que eu gostaria que fizesse: Pensou.
Lembranças minhas, 
P.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

O som de porta batendo

Quarta-feira, 17 de Agosto

Querido Leitor,


Ela bateu a porta violentamente e de propósito. Ela sabia o quanto batidas de porta o irritavam. Dessa vez ela bateu a porta e deixou dentro de casa tudo aquilo que ela nunca aprovou, e sempre foi obrigada a engolir silenciosamente. Agora tudo acabara, aquela tinha sido a batida definitiva que separou o mundo dela daquele precipício todo. E ao enterrar definitivamente seu velho destino ela lembrou das noites vazias no seu antigo quarto, do cigarro fumado na janela e do “BOM AR” que ficava escondido no guarda-roupa e que era usado pra disfarçar o mau cheiro cinzento. Lembrou das vezes que ficou de porre sozinha e das garrafas de run vazias que ela começou a colecionar pra se lembrar depois. Todas elas eram riscadas com a data e ficavam numa cômoda trancada à chave e que quando perguntavam servia pra guardar coisas velhas. Ela tinha ficado boa em esconder tudo. Apagar os rastros, disfarçar os cheiros, jogar nos lixos certos as provas do crime passional que ela cometera. Deixar de ser ela pra ser alguém que ela nunca quis ser. Depois de tanto tempo fingindo ser aquilo que nunca tinha sido, parecia fácil se acostumar, mas isso não seria ela. Aquela mulher altiva, vinte e poucos anos, signo de fogo, e cheia de ideias perversas. Ela bateu a porta e fechou de vez as possibilidades de voltar a ser aquele espectro que fazia tudo certo, pros outros, e que estava se matando aos poucos. Agora ia pra qualquer lugar, onde o endereço não fosse de alguém importante, onde as paredes fossem de qualquer cor, menos branca e sem vida, onde o perfume que exalasse da sua casa não fosse de "BOM AR", mas de cereja, pimenta ou simplesmente o cheiro da fumaça do seu cigarro. Algo dela e que só ela desse ordens, que só ela escolhesse o que fazer pro jantar, ou que ela pudesse convidar as figuras mais exóticas que conhecesse durante o dia, pra trocar uma ideia tomando uma dose de run. Aquela mulher era linda, mas ficava mais linda quando era quem ela queria ser, sem se limitar a quatro paredes pintadas de branco e um quadro de uma senhora idosa pregado na sala.  Depois da derradeira batida, ela enfim, tomara as rédeas da sua vida.

Com meia afeição,
P.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Primeiro Esquisso.

Quarta, 27 de Julho
Querida remetente,


Eis aqui um alguém errante. Talvez essa seja a minha melhor definição. Mas no meu íntimo eu sei que sou apenas alguém que fez um pacto amistoso com os defeitos, às más inclinações e principalmente com os erros. Eu tenho vivido e me dado conta de que ainda continuo a mesma turrona de sempre, ainda persisto teimosamente no que eu quero e ainda sou egoísta como desde que eu me lembro. Poucas coisas realmente mudam na gente com o tempo. Devo admitir que ando menos ansiosa que antes, respeito mais minha saúde, e meço mais minhas palavras hoje em dia. Outras coisas ainda me incomodam. O aumento dos preços, das religiões e dos partidos políticos, por exemplo. E eu ainda não aceitei bem o lance do homossexualismo. Mas nada que o tempo não resolva. O que o tempo não pode resolver é minha insatisfação por não aceitarem o jeito como eu lido com as coisas, como eu penso, como eu sou. Não me entendam mal, não sou do tipo que liga pra opiniões alheias, pelo menos não das pessoas que não amo. Não se trata de recriminações pela minha escolha do time de futebol, ou meu gosto musical meio raro, ou minhas manias chatas como colocar o palito de fósforo queimado de volta na caixa. É o jeito como eu sou de verdade que incomoda. Pode até ser egocêntrico, mas as vezes eu tenho a impressão de que apenas eu gosto de mim como eu sou, sem tirar nem pôr, sabe. Digo isso porque adoro o jeito como eu me admiro na frente do espelho, o jeito como eu brigo pelo que eu quero, e eu gosto mesmo do meu jeito de amar as pessoas, sem sufocá-las, sem cobrar nada, as vezes até sem demonstrar do jeito tradicional, mas amando. Exageradamente, também. Gosto de exagerar, e gosto também dos apelidos criativos que eu invento, e até das piadas sem graça que eu conto. Digo isso porque eu adoraria receber as mensagens de texto que eu envio em horas impróprias, e ia achar o máximo os telefonemas que eu dou sem razão aparente. Eu queria receber os presentes exóticos que eu dou como pedras que são sementes, em dias úteis. E também não acharia ruim ter uma música dedicada pra mim. Eu realmente queria alguém como eu na minha vida, pra não me fazer cobranças, pra elogiar meu cabelo desarrumado quando todo mundo me manda cortar, e até os meus silêncios e momentos estranhos eu saberia entender. Eu queria alguém que como eu gostasse de canecas, que ouvisse música antiga, que gostasse de pamonha com nata. Alguém que não curtisse regras, e que achasse a relatividade uma coisa grandiosa. Não sei bem se existem regras para um bom relacionamento, já que não consigo aplicá-las na minha vida, elas me soam superficiais e impróprias para pessoas de carne, ossos e um monte de defeitos. Aprecio a espontaneidade e a sinceridade que Deus me concedeu. Isso de não saber disfarçar sentimentos é algo verdadeiro e muito humano. Algo que não finja não ter raiva ou não estar magoado, que não disfarce a dor, o ciúme ou um desejo proibido, que não engula seco nem guarde palavras, que diga, que faça, que sinta, que seja. E admita o que é, já que o que os outros acham nunca é o que somos de verdade. Afinal, ninguém nos conhece melhor que nós mesmos.
Com cuidado e afeição, 
P.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Todo o meu amor cabe na palma da minha mão.

Segunda, 25 de Julho


Querido P,

Todo o meu amor cabe na palma da minha mão
Na mão que você um dia beijou e jurou amor eterno
Na mão que você acariciou, juntou com sua e trouxe pra perto
Na mão de algo que já foi amor, e hoje é futuro incerto.


Todo o meu amor cabe na palma da minha mão
Na mesma mão que eu trouxe pra boca, tímida sem saber o que dizer
Na mão que tremeu ouvindo suas duras palavras, sem merecer
Na mão que enxugou as lágrimas, sem entender.


Todo o meu amor coube na palma da sua mão
Na mão que eu entreguei todos os meus sentimentos singelos
Todos os meus motivos, suspiros e poemas sinceros
Na mão que eu segurei e fiz dela um elo


Todo o meu amor escorreu da palma das nossas mãos
Nas mãos que um dia se entrelaçaram e delas escorreram litros de amor
Das mãos que hoje seguram outra mão
Com unhas pintadas de outra cor.


Com meias mágoas,
P.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Mudaram as estações. No fim, nada mudou.

Sexta, 20 de Maio
Querido Leitor,
Nada como os amores de Verão. Eles começam no nascer de um dia ensolarado na praia e geralmente, se vão quando as malas ficam prontas e dizemos o velho: ”Foi bom te conhecer”. Ele foi um desses amores que ascendem ao passo da estação mais quente do ano e se transformou em uma das melhores lembranças pra se guardar. Eu me lembro dos seus gestos tão controlados e das frases bem pensadas, da timidez instigante que contrastava com seus olhos insinuantes e de pouco pudor. Aquele sorriso de canto de boca que deixava tanta coisa escondida em entrelinhas que me enchiam de ideias perversas. Ele era bonito. Uma beleza morena sem holofotes, daquelas que chamam a atenção sutilmente, apenas dos bons observadores. E eu poderia me perder no meio daquela beleza toda, tão perspicaz, tão sólida, tão embriagante. Mas a beleza pode até ser regra em amores veronescos. Ele era mais que beleza pra mim. Era uma incógnita que eu queria muito decifrar. Não sei se era o signo, o nome, os gostos unânimes, ou simplesmente o timbre da sua voz tão masculina e segura, que me faziam devanear, e até pensar em futuro. O que eu sei é que o destino é mesmo algo misterioso. Nos apresentou naquela noite quente de um jeito nada convencional, nos deu de presente um lindo amanhecer do alto de um penhasco pra compartilharmos juntos, e assim, colocou em nossa memória uma bela  história em forma de beijos, poesias e canções impossíveis de serem esquecidas. O que esquecemos, na verdade, era que isso era apenas um amor de verão, com prazo de validade. Porém aquela história condicionada por anéis em troca de beijos durou mais que uma estação. Mudou-se o tempo, várias luas cheias passaram. E essa nova temporada não era quente, mas era bem aconchegante como toda paixão que se transforma em amizade, em cumplicidade. Nos valemos desse cair de folhas para permanecermos juntos de uma forma pitoresca, assim como os Outonos são. Comemoramos nossos aniversários, trocamos cartas, nos aconselhamos mutuamente nas nossas outras relações e ficamos bem assim. Veio o Inverno e as tempestades e ventanias nos afastaram drasticamente, uma ruptura abrupta e violenta. Foi a estação que mais tardou passar. Uma Odisséia.  Eu trançava o meu bordado de dia, e desmanchava de noite, esperando a temporada das flores chegar. Regava o meu jardim com a esperança de tê-lo de novo, quem sabe numa outra estação. A Primavera veio, e com ela, a maturidade e a aceitação. E eu já não esperava mais, e nem culpava as estações por bagunçarem minha vida. Eu aprendera que elas eram circunstâncias incontestáveis de um calendário superior. Mas qual não foi a minha surpresa, minha paixão veronesca voltou, assim que os raios incidiram de novo sobre a terra, anunciando a melhor estação. O sol bateu na janela do meu quarto trazendo com ele as lembranças daqueles nossos dias quentes bem vividos. No Verão tudo volta. O sol, as andorinhas, as marcas de biquíni, os amores extraviados no Verão passado.
Com nostalgia e afeto, 
P.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Um brinde às garotas que viram mulheres.

                                       Quarta, 20 de Abril.
Querida V,  



Eu tinha uns quatorze, quinze anos. E ele era quatro anos mais velho. Hoje, isso não tem muita importância, mas naqueles tempos era uma diferença abissal. E principalmente porque eu jurava que o amava. Mas na verdade, você ama quase todo mundo com essa idade, e no meu mundo eu me lembro de querer ser mais velha pra tentar fazer com que ele notasse o quanto eu estava apaixonada. Tornamos-nos amigos e nos falávamos toda noite, ritualmente, por horas, sobre nossas vidas, nossos planos, e também muitas banalidades. E na minha cabeça, éramos mais que amigos, já estávamos um na vida do outro, sentíamos necessidade de contar pro outro como foi o dia e ouvir as novidades por telefone. Ou pelo menos, eu me sentia assim. E tudo começou quando em uma dessas nossas conversas, eu me declarei. Ele disse que já imaginava, e que a gente podia se encontrar qualquer dia. Encontramos-nos, eu fantasiando que tudo ia ser mágico, ele... ele do jeito que sempre foi. Certamente eu estava com expectativas demais, e me decepcionei quando nos beijamos friamente e ele continuou falando sobre um professor que o deixava em paz. Fui pra casa triste, porém não vencida, afinal, eu tinha conseguido o que eu queria. Depois daquele dia, tudo continuou igual, não nos beijamos mais, ele definitivamente não olhava pra mim do jeito que eu gostaria. Tudo chegou ao ápice quando em uma de nossas conversas ele disse que eu era criança demais pra ele. Com o orgulho ferido e os sentimentos dilacerados, fui forte o suficiente pra primeiramente explodir em raiva e dizer tudo aquilo que as pessoas desiludidas dizem ao cair em si, e segundo e mais difícil, tirá-lo da minha vida e do meu coração. Eu tinha levado um banho de água fria, mas me recompus por dentro como só as mulheres conseguem fazer. Eu o superei. Depois disso não nos falamos mais. Eu, por um ódio mortal que se transformou em indiferença, e ele por vergonha, talvez. Fui viver minha vida com mais uma lição aprendida e mudei. Deixei aquela “criança “ ingênua pra trás. Conheci outros caras mais interessantes e vivi muito bem assim todo esse tempo. Até que ele resolveu voltar, me pedindo perdão e se lamentando pelo tempo que perdeu longe de mim. Eu sempre imaginei que isso um dia iria acontecer, só não pensava que minha reação seria tão passiva quanto foi. Eu o perdoei, apesar de já ter feito isso quando o esqueci. O que eu senti? Eu me senti vingada, mas até a vingança tem um prazo de validade. Aquele cara que na época me parecia tão superior, agora era só mais um cara que viu o quanto chamava a atenção. O quanto eu tinha me tornado mais bonita, segura, cheia de amigos, o quanto eu tinha crescido. Ele viu que perdeu algo que no passado ele tinha nas mãos e não soube dar o devido valor. Agora o que restou pra ele foi admirar de longe e ver o quanto o passado é cruel quando volta pra nos cobrar aquilo que fomos. A menina que ele já ouviu dizer que o amava agora era uma mulher que ele só vê de longe, de fora da sua vida.

Com doses revanchistas,
P.

domingo, 3 de abril de 2011

Encontro o amor e depois perco

Domingo, 03 de Abril
Querido Leitor,



Encontro o amor em todos os lugares em que me acho
Me perco entre seus dedos brincantes , suspiros insinuantes , catracas a me limitar.
Seus olhares furtivos, chamegos definhativos, lençóis que me enlaçam.
Me dou pro amor e torno-me nele um escravo, que acha gozo em preso estar.


Acho o amor e nele me perco
Pra ser aquilo que o amor quer que eu seja.
Torno-me amante louco, exacerbado, exagerado e delirante
Me enrosco entre os seus cabelos, e perfumes, e sabores afrodisíacos
até me encher, esborrar e saturar com o seu efeito viciante


E, de tanto amar e em amor me dar, perco o juízo
A razão, o fio da meada do entendimento de mim
Esqueço da hora, dos amigos, das contas pra pagar
O leite no fogo, o trabalho, aquilo que há pra gastar
E me esqueço quem eu era, deixo a minha vida passar, me perco de mim.


Encontro o amor e depois perco, Peco de tanto amar
E de tanto amor que dou, ninguém consegue
Amor demasiado assim também me dar
E por amor eu peco, me deixo de lado, amo aquilo que for
E depois de me perder, perco também aquilo que eu chamava de amor.

Com desistências minhas,
P.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Murmúrios de um cético amoroso

Sexta, 01 de Abril
Querido M,





E quando você pensar
Que tudo é arriscado demais
Pra um coração que não quer amar
Se lembre dos olhares confidentes, e das paixões que deixou passar


Se lembre do prazer de um par de mãos andando juntas
E das confidencias perversas que podia compartilhar
Das tardes monótonas de quarta feira
Que passaram sem você olhar


O tanto de coisa que você perdeu
Achando que não sofrer é o melhor remédio
Pra alguém que no fundo desejou,
e em face ao tudo se entregou ao tédio


Talvez seja melhor andar sozinho
Nessa estrada de meios termos
Onde nada parece completo
E você encontra tudo, menos alguém confiável pra dedicar seu afeto.


Compre uma taça de vinho e um amor que facilmente esqueça
Que no dia seguinte sobre apenas uma leve dor de cabeça
E você sinta a sensação de um nada consumidor
Pra que você perceba que melhor mesmo era sofrer, mas ter um grande amor.


Meus sentimentos, 
P.

sábado, 19 de março de 2011

Acaso.

Sábado, 19 de Março

Querido B,







Você precisa sair mais, encontrar a relevância
Parar de pensar naquelas coisas que atrapalham a inconstância
Às vezes precisamos de mais ideias que razões

Pra que agente não caia na teia das desilusões


Saber que existe um certo, que não combina com a conveniência
Ignorar algo mais concreto do que a mera conhecidência
O acaso é mais sadio que aquela sorte fantasiada

E os planos que fazemos não passam de listas mal interpretadas


Então grite, jogue fora o que não presta
Tem tanta gente perdido, não planejar é o que nos resta


Porque o que realmente importa são aquelas coisas que todos olham, e ninguém vê
Aquelas entrelinhas compridas que terminam ao passo do muito viver
E quem de nós pode dizer que tudo isso é desimportância?
Se nem Maomé com toda a sua periculosidade encontrou a semelhança



Eu prefiro ser anônimo desse tipo de coisa premeditada
Gosto daquelas vírgulas que são deixadas na calçada
Prefiro ser cego de um olho e ver além do infinito
Do que viver procurando a sorte pra andar comigo.


À espera de uma resposta boa,
P.

sábado, 12 de março de 2011

Tributo a Cartola

Sábado, 12 de Março

Querido Cartola,






Ah, velho poeta, por favor, me deixe entrar
Já vim errando de bar em bar
Atrás de um pouco de emoção


Me deixa sentar e colher um pouco
Dos poemas que escorrem soltos
Das tuas mãos, nessa mesa de bar


Eu já fiquei no parapeito da janela
Esperando que rosas belas exalassem
O meu perfume pelo ar
Mas quanto mais escrevo, mais percebo
Que só a tua melodia é que faz uma rosa falar.


Cartola, pelo que tu foste eu canto
E ainda mais amor encontro, quando
Tua poesia desata a me fazer chorar



Sei que de cabo a rabo de todo o samba
Tá pra nascer alguém mais bamba
Que cante rosas, moinhos e amor
Do jeito que o senhor, Divino Cartola, cantou.



Com sincera admiração, 
P.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Pacto de Não Solidão.

Sexta, 18 de Fevereiro
Querido M,



Vamos negociar um acordo de não solidão
Tentar passar por essa vida não ficando tão sozinhos
Deixar nas esquinas os casos mal resolvidos
Comprar uns travesseiros, uma garrafa de vinho


Estamos unidos pelas ilusões, pelas fantasias rearranjadas
Vamos brindar aos sentimentos esquecidos
e as poesias feitas que nem eram esperadas


Você me faz companhia, eu prometo ser seu par
A gente vai ficando junto até o dia clarear
E se faltar sentimento, a gente finge que ele está lá
Compensamos com conversas bobas, não deixamos o silencio chegar


Vamos fazer um pacto de não solidão
Jogar fora os retalhos sujos do que nunca nos pertenceu
E assim sem compromisso
Somos naquele instante, um do outro, sem chegada e nenhum adeus.




À espera de algo seu,
 P.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Selo de Qualidade.




Pessoas,

Recebi esse selo super legal dos meus queridos blogueiros @michel_chaves do blog "Nem comento" e @diegofm do blog " FLeA".

e como não tenho o hábito de seguir regras virtuais, repasso não à 15 blogs mas à 10 blogs que eu sigo essa benfeitoria que achei super criativa.

Vamos lá.

Eu & o entendimento Social - http://oentendimento.blogspot.com/ 
Nada é pequeno no amor - http://todagarota01.blogspot.com/
Pensamentos de Grapilho - http://grapilho.blogspot.com/ 


As perguntas respondidas:
Nome: Priscilla.
Uma música: São tantas. Mas ' Medieval II' é a indicada.
Humor: Qualquer tipo, desde besta até negro. Rio por besteira.
Uma cor: Azul
Uma estação: Verão.
Como prefere viajar: Com os amigos sempre é surpreendente.
Um seriado: Tantos. Mas pode ser ' Supernatural' ou 'Damages'.
Frase e/ou palavra mais dita por você: e Porque não?!
O que achou do Selo: Criativo.




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Estilhaços de um discurso amoroso

Terça, 18 de Janeiro
Querido inventor do amor,



Nunca entendi muito bem o amor. E quando eu digo amor é "amor alheio", porque o meu faz todo sentido. O jeito de amar dos outros é o que realmente me intriga. Já vi tanta gente que diz que ama e eu não via esse amor, ele não era palpável como o meu costuma ser. Amor de dizer que é, não representa grande coisa, principalmente numa realidade em que todo mundo "ama" todo mundo.


Amor de sentidos sim, me parece mais real. Amor de paladar, de provar tantos outros amores e escolher um só, o mais gostoso. A visão, que louca, busca um colírio pros olhos e de tanto olhar tem a certeza qual amor é. Amor que ouve, e decora os timbres e facetas de tanto ouvi-lo, faz de alguém sinfonia e não se cansa de repeti-la sempre. O amor de perfumes, ou de apenas cheiro de pele. Aquele que conhece o aroma que sinaliza seu objeto de desejo, que sabe que ele pode ser usado por outras pessoas, mas nunca confunde o que anuncia a chegada de quem se ama. Amor de toque. Aquele de pele, de corpo, de sexo, e porque não seria amor?! É um amor que conhece, que sente, que sabe.


O amor dos outros é platônico, amor sem sentidos, sem reciprocidade. Pode até ser amor, mas eu o desconheço, porque amor correspondido é muito mais satisfatório. Também não entendo amor que abre mão da pessoa amada, que diz que deixa por amor. Como se diz amor algo que não é par?! Esses amores que se escondem atrás de adjetivos minimalistas e bondosos é uma desculpa de quem não que mais amar.


Amores novelescos, que enfrentam impossibilidades são irreais demais pra mim. Amor de verdade não precisa de tanto, é só questão de vontade. E as idas e vindas são sinais de amor, principalmente as voltas. São reafirmações de sentimentos que não morrem. Amor não é amor porque não há um outro sentimento que substitua. Não é paixão que perpetua, afeto e amizade endossadas de tempo e nem desejo súbito e instantâneo. Amor é simplesmente amor, a arte dos encontros, desencontros e reencontros, coisas que sinalizam vontade de ser par, sentimentos que se fazem em uníssono e não só "boca pra fora".


Amor é cacos de vidro, corações partidos, coisas que ficam de propósito. Quando não for isso, é apenas casualidade, mania, vício, não tem nada a ver com amor.


Com (in)dignação,
P.
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domingo, 2 de janeiro de 2011

Mãe.

Domingo, 2 de Janeiro
Querido Leitor,






Minha mãe sempre foi tirana. E ela gostava de praticar isso com a gente. São incontáveis as vezes que ela nos impedira de sair, de viajar com os amigos, de dormir na casa de estranhos, de ficar até altas horas na TV ou no computador. E quando eu perguntava o porquê, ela sempre dizia que era minha mãe e eu tinha que obedecer. Os tempos vão passando e você vai percebendo que mesmo agindo tiranamente, as intenções dela eram boas. Hoje, um pouco mais crescida, ela ainda arruma um jeito de tiranizar um pouco a minha vida, mas sabendo que o principal eu já aprendi.
Nunca fomos amigas. Sempre mantivemos uma relação de mãe e filha, sem muitas afinidades, infelizmente. Mas hoje, devo muito do que eu sou a ela, e as vezes até me surpreendo em como os seus ensinamentos atormentam minha conduta.
Ela era e sempre foi dura na queda. Eu nunca consegui convencê-la a nada. Meu poder persuasivo nunca funcionou. Eu sempre odiei me sentir certa e ao mesmo tempo isso nada adiantar porque ela nunca dera o braço a torcer. Foi isso que a ajudou a crescer no mundo profissional. Ela sempre mantinha a ordem das coisas no trabalho. E era bonito ver o quanto as pessoas a respeitavam e a obedeciam, porque ela sempre tinha certeza do que fazer. Eu nunca dizia o quanto a admirava quando a via dando ordens, mas a verdade é que eu olhava e pensava em ser como ela quando crescesse.
Os excessos de cuidados vinham sempre acompanhados de muita exigência. Éramos obrigadas a fazer serviços domésticos, mesmo com empregada em casa. Eu me lembro que achava tudo aquilo ridículo e desnecessário, porque afinal não precisávamos. O fato é que hoje, fazemos tudo em casa e nos viramos muito bem, graças a isso. Olhando pro passado, vejo que era uma forma em que ela nos ensinava a ser humildes, e saber de tudo um pouco. Com uma mania sobre-humana perfeccionista, tudo que fazíamos podia ser melhorado, e por mais que fizéssemos sempre havia algo mais faltando fazer. Eu sentia muita raiva disso e muitas vezes chorava por nunca conseguir agradá-la por completo. Ela não estava certa, mas nos ensinou a procurar sempre fazer mais, fazer melhor, buscar a perfeição. Eu acabei herdando essa característica, talvez por convívio excessivo.
Ela errou muito na vida, como todo mundo. Eu via isso. Mas sentia que ela procurava lidar com isso, e se esforçava pra se perdoar. Recomeçar. Nunca concordávamos. Era impressionante. Muitas e muitas vezes ela dizia que eu tinha a opinião contrária só pra não parecer com ela. Ela era meu inferno astral, meu empata diversão, meu maior obstáculo e MINHA MÃE. E eu tinha que aprender a lidar com isso. E sei também que pra ela não era fácil lidar com uma adolescente com desejo de liberdade, opiniões próprias e com espírito questionador.
Sempre achei que ela fosse bipolar. Ou de lua. Algo instável demais pra eu entender. Algo além da minha capacidade de entendimento. Eu olhava, parava e pensava o quanto era difícil conviver com ela.
A verdade é que as duas eram orgulhosas demais pra pedir perdão, demonstrar afeto depois de uma briga ou admitir um erro. Mas eu sempre vi, todos esses anos, uma mulher forte, com ideias firmes e muito criativa. E por vezes eu a admirei em silêncio.
Minha mãe sempre teve muitos defeitos. E ainda os tem. E não vai mudar. Eu desisti a algum tempo de tentar entendê-la ou algo parecido. Decidi amá-la pelo que ela é, e aceitar suas decisões. Hoje, eu só tenho a agradecer as coisas que ela me ensinou. Direta ou indiretamente, eu aprendi a crescer com tudo que a vida nos traz, ser forte, vencer. Devo, além da minha vida, o meu aprendizado mais precioso. E só observá-la me ensinou muito. Conviver com ela, brigar, enxugar suas lágrimas e tê-la como mãe tem sido algo que vou guardar pra sempre.
Com Afeição submissa,
P.


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