Recife, 03 de Dezembro
Querido M,
Vai faltar chão pra nós dois. Vai faltar ar respirável, que não seja fumaça de cigarro ou ar condicionado. Vai faltar espaço, vamos empurrar os móveis, tirar a cama do lugar, quebrar alguns Suvinís que tiverem na estante. Vai faltar música que defina a intensidade disso tudo, e não vai ter verso certo pra contar essas nossas travessuras. Vai faltar expectador, luz, gravidade, quando a gente se encontrar. Vai faltar tempo pra pôr em prática todas as nossas idéias perversas, e quanto mais tempo a gente tiver, mais idéias vão surgir, mais tempo vai faltar. Vamos fazer um mixto quente de pele, suor, colchão, você e eu. Porque vai faltar nexo, mesa, roupa. Vai faltar previsão no horóscopo sobre o nosso amor. A lua estará minguante, e nem será tempo de Vênus. Vai faltar explicação, equação matemática, prova científica. A gente vai contrariar a física, que se danem as leis de Newton, os nossos corpos vão coexistir. Vai faltar água pra apagar o fogo dobrado dos nossos signos. E vai faltar quem não morra de inveja da gente. A gente vai beber água no copo da Mc'Donalds, e nem vai se importar se não tiver nada comível na geladeira. A gente vai viver um do outro. Vai faltar teto pro tanto de prazer que a gente vai ter junto. Os vizinhos vão ficar ouvindo as nossas risadas e tentando imitar a nossa felicidade. Vai faltar sono, televisão, telefone tocando. Quando a gente tiver junto, o mundo lá fora vai se dissolver num plácido desejo de que a gente continue, apenas. A gente vai se sentir completo, satisfeito, como quem mata a fome. Vai sobrar sentimento, cheiro de perfume, temperatura alta, você e eu.
Saudades,
P.
Nenhum comentário:
Postar um comentário